quarta-feira, 1 de fevereiro de 2017

QUANDO AS PESSOAS NOS METEM MEDO!

Numa análise rápida poderíamos pensar que o mote atribuído a este artigo tem algo de descabido. Ter medo de pessoas iguais a nós? Receio de indivíduos que pertencem à mesma espécie? Não, nem pensar. Medo é para sentirmos quando avistamos uma cobra ou quando um cão nos mostra um ar ameaçador. 

Na verdade sentimos sim, inúmeras vezes, receio de pessoas, medo relativamente aquilo que elas pensarão de nós e receio de fazer as coisas mal e nos colocar “a jeito” para receber comentários ou opiniões menos positivas. A este medo chamamos ansiedade social

Quando procuramos a sua origem nas prestativas evolutivas verificamos que tem por base as hierarquias de dominância-submissão, ou seja, de comparação social (Gilbert & Trower, 2001; Marshall, 1994). Efetivamente a resposta de ansiedade está relacionada com a integração do indivíduo no grupo, levando a que este se mantenha preocupado acerca da forma como os seus comportamentos, discurso e/ou aparência terão impacto nos outros (Gilbert, 2001). 

Como qualquer resposta de ansiedade verificamos aspetos positivas neste mecanismo automaticamente desencadeado, porém, quando a ansiedade toma proporções exageradas, leva a interferência no funcionamento habitual do sujeito e experiências prolongadas de grande desconforto e desgaste emocional (Cunha, Pinto Gouveia, & Soares, 2007). Assim, a ansiedade social adaptativa e funcional distingue-se da perturbação de ansiedade social (PAS), em termos das suas manifestações, ou seja, em termos da frequência e intensidade com que sujeitos experienciam os sintomas de ansiedade (Kearney & Drake, 2002).

De acordo com os critérios do DSM-5 a PAS caracteriza-se como um medo intenso e duradouro de uma ou mais situações de sociais e de desempenho em que o sujeito se encontra exposto à observação dos outros e experiencia o medo de se comportar de forma humilhante ou embaraçosa. A ansiedade sentida não é proporcional à ameaça real e as situações sociais e de desempenho são evitadas ou enfrentadas com grande mal-estar. A perturbação de ansiedade social só é diagnosticada quando a ansiedade se torna tão intensa e generalizada que causa um sofrimento significativo ou prejudica a capacidade de funcionamento do indivíduo. 

Esta perturbação afeta quer crianças e adolescentes como adultos. No primeiro caso são frequentes as recusas em ler em voz alta perante a turma, realizar exercícios no quadro, apresentar oralmente um livro à turma e realizar qualquer exercício quando está perante o olhar atento da professora. Em contexto social verifica-se um predominante isolamento e dificuldades pelo estabelecimento de relações com colegas e tentativas constantes para passar o mais despercebido possível.  Quando manifestada pelos adultos verifica-se a preferência por tarefas a realizar isoladamente em detrimento do trabalho de grupo, tentativas de fuga perante contatos sociais, dificuldades em ir a entrevistas de emprego, dificuldade em manter o contato ocular com o outro ou mesmo em andar em transportes públicos. 

A perturbação de ansiedade social é, independentemente da faixa etária do sujeito, altamente interferente no dia-a-dia e dificulta de forma acentuada a sua integração e sucesso social e profissional/académico. 

No que se refere à intervenção clínica sabemos pelos estudos efetuados que a intervenção cognitivo-comportamental é aquela que mais eficaz se mostra na redução dos sintomas de ansiedade e na promoção do ajustamento emocional do sujeito, essencialmente através das seguintes estratégias:


- Promover o reconhecimento das manifestações de ansiedade e conhecimento de estratégias para responder ajustadamente;
- Promover as competências de reconhecimento e substituição dos Pensamentos Automáticos Negativos geradores de ansiedade;
Promoção da aquisição de estratégias para o envolvimento progressivo em situações geradoras de ansiedade por forma a reduzir os comportamentos de evitamento.

É de salientar que em algumas situações poderá ser necessário o recurso a terapia medicamentosa como terapêutica coadjuvante à psicoterapia.  

Consegue rever-se nas características apresentadas?
Sente estas dificuldades no seu dia-a-dia?

Deixamos algumas dicas práticas que podem ajudar!!!

  1.  Evitar as situações temidas não é uma boa estratégia. No momento parece resultar mas a longo prazo permite manter e generalizar o problema.
  2.  Pense que todos estão sujeitos a falhar e que isso não tem nada de mais;
  3. Observe situações em que os outros também falharam e atente aos seus pensamentos relativos a essa pessoa. Não são assim tão maus pois não?
  4. Quando tiver uma situação social programada prepare-se o melhor possível de forma a sentir-se confiante. Porque não treinar aquela apresentação em frente ao espelho?
  5. Lembre-se sempre que a ansiedade é desconfortável mas tal como subiu acaba por descer e não há nada de mal que lhe possa acontecer.
  6. Se estas estratégias não estiverem a resultar e o problema se mantiver procure um profissional especializado que o posso ajudar!!!!


Cátia Morais
Psicóloga Clínica
Encontram-na |aqui
5 Sentidos - Espaço de Reabilitação e Intervenção PsicoEducacional

Bibliografia consultada:

American Psychiatric Association. (2013). Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais: DSM-V. Washington, DC: Climepsi Editores.

Cunha, M., Pinto-Gouveia, J., & Soares, I. (2007). Natureza, frequência e consequências dos medos sociais na adolescência: Dados na população portuguesa. Psychologica, 44, 207-236.

Gilbert, P. (2001). Evolution and social anxiety. The role of attraction, social competition, and social hierarchies. Psychiatric Clinics of North America, 24(4), 723-751. DOI: 10.1016/S0193-953X(05)70260-4.

-Gilbert, P., & Trower, P. (2001). Evolution and process in social anxiety. In W. Croizier & L. E. Alden (Eds.), International handbook of social anxiety: Concepts, research, and interventions relating to the self and shyness (pp. 259-280). New York: Wiley.

Kearney, C. A. & Drake, K. (2002). Social Phobia. In M. Hersen. (Eds.), Clinical Behavior Therapy Adults and Children. (pp. 326-344). New York: John Wiley & Sons

- Marshall, J. R. (1994). Social phobia: from shyness to stage fright. New York: Basic Books.

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